o bodo aos ricos


Não sei porque é que a esquerda, alguma esquerda, se insurgiu contra as palavras de António Barreto no seu discurso do 10 de Junho. Nem a constituição é uma vaca sagrada nem ela nos tem assegurado um sistema político impoluto e verdadeiramente participativo. Se a ideia é mudá-la de forma a melhorar a qualidade da democracia, torná-la verdadeira e não uma fantochada de que uns tantos se aproveitam em regime de alterne, vamos a isso!

Alguns hipócritas, e há-os tantos por este desconsolado país, chamam anti-democratas, qualquer dia fascistas se para tanto lhes der na gana, que engenho e arte já têm, aos que, do 12 de Março às acampadas no Rossio e noutras praças de Portugal, têm vindo a reivindicar uma democracia autêntica. O povo vota, contrapõem essas luminárias, logo, se vota, há democracia. Esquecem-se, ou fingem esquecer-se, que a maioria absoluta pertence aos abstencionistas. E, destes, muitos não votam em sinal de protesto, outros não o fazem porque não se identificam com nenhum partido, e outros tantos estarão nas tintas para a política, o que também deveria envergonhar os políticos, coisa que não acontece porque esse é sentimento que, neles, raramente se manifesta. 

Falemos claro. Muitos portugueses, se ainda continuam teimosamente a votar ao fim de mais de 35 anos de descalabros, fazem-no a contragosto num qualquer mal menor numa tentativa de salvar o pouco que resta da esperança de Abril. 

Anti-democrático será dizer que a abstenção não conta, porque essa gente de nada vale para o regime. Pois é isso que eles, os pensadores do regime, gostam de dizer ou de deixar subentendido: que metade dos portugueses não existe, não presta, é um estorvo, uma caterva de inconscientes e de parasitas.

Se fizermos bem as contas, e chamem-me anti-democrata que me estou a borrifar de alto e de repuxo, isto para não recorrer ao vernáculo de que dá tanta vontade, só uma reduzidíssima minoria de portugueses votará hoje em dia com convicção, uns porque acreditam piamente nas virtudes do seu partido e nos risonhos futuros que lhes cantam em arruadas e comícios, outros porque sabem que serão bafejados com algumas migalhas do bodo aos ricos que se segue a cada eleição.

Mudar a constituição? Vamos a isso. Para melhor. Para pior, já basta assim. Livra!

Comentários

Mensagens populares deste blogue

valha-nos santo eucarário!